Erasmo Carlos é revivido em potente álbum póstumo com gravações dos anos 70
6 de junho de 2023
Por Mauro Ferreira
♪ Erasmo Carlos (5 de junho de 1941 – 22 de novembro de 2022) faria hoje 82 anos se não tivesse saído de cena há seis meses, enlutando sucessivas gerações de roqueiros brasileiros. O aniversário é festejado com a edição do primeiro lançamento fonográfico póstumo do Tremendão, Erasmo Carlos ao vivo – Anos 70.
Produto da descoberta de gravações inéditas, ouvidas e avalizadas em 2017 pelo artista carioca, que chegou a supervisionar o lançamento dos registros ao lado do filho e empresário Léo Esteves, o álbum reúne 25 números de três shows realizados pelo cantor em 1975, 1977 e 1979 com bandas e repertórios diferentes.
Na era dos CDs, o produtor e pesquisador musical Marcelo Fróes teria posto no mercado uma caixa com três discos, um com cada registro de show, como fez tantas vezes ao lançar inéditas gravações ao vivo de cantores e grupos.
Na era da música digital, o álbum está nos aplicativos de música – disponível desde sexta-feira, 2 de junho – com as 25 faixas alocadas lado a lado sem maiores informações sobre a procedência das gravações.
As primeiras nove faixas foram extraídas de show apresentado por Erasmo na cidade de São Paulo (SP), em 1975, com a Cia. Paulista de Rock. Considerados os limites técnicos da época, pode-se dizer que o som está potente. A pegada da banda é afiada, como fica claro logo na primeira música, O homem da motocicleta (Motorcycle man, Floyd Robinson, em versão em português de Erasmo Carlos, 1966).
Trata-se de show de rock, às vezes do primal rock’n’roll da década de 1950 que tanto fascinou o garoto da Tijuca. Música cantada em inglês com emissão sofrível (mas quem liga para dicção no mundo do rock’n’roll?), Bolas azuis (Gabriel, Ion, Rubão, Paschoal, Perna e Amiden, 1974) encerra a primeira gravação com declaração de amor de Erasmo a esse tal de roque enrow.
A música Bolas azuis fez parte do álbum 1990 – Projeto Salva Terra!, lançado pelo cantor em 1974. Desse disco, Erasmo também rebobina no show Sou uma criança, não entendo nada (Erasmo Carlos e Ghiaroni, 1974), A lenda de Bob Nelson (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1974) e Haroldo, o robot doméstico (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1974). Várias faixas ultrapassam os sete minutos de duração.
“A Bolha e Erasmo Carlos estão felizes por essa maravilha”, ressaltou o cantor no palco do Museu de Arte Moderna, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), em show apresentado em 1977. Desse show, feito com a banda A Bolha e também pautado pelo rock, o álbum eterniza seis músicas.
Entre sucessos da Jovem Guarda, há duas parcerias de Erasmo com Roberto Carlos – Análise descontraída e Filho único – apresentadas pelo Tremendão no ano anterior no álbum Banda dos Contentes (1976).
Os hits das jovens tardes de domingo reaparecem no terceiro show, captado em 1979 na boate Biblos na cidade do Rio de Janeiro (RJ). Trata-se da menos roqueira das três apresentações, até pelo intimismo inevitável no palco de uma boate.
Por esse intimismo, nesse show, Erasmo abriu espaço para baladas da parceria com Roberto, como Sentado à beira do caminho (1969) e Café da manhã (1978), surpresa do roteiro por ser essencialmente uma canção do Roberto – “Caçulinha bem metida à besta que já está querendo disputar na linha das nossas preferidas de todos os tempos, e está conseguindo isso”, com brincou o cantor antes de servir terna e serenamente Café da manhã ,com direito à citação de Os seus botões (1976), outra canção sensual da dupla (também citada por Roberto no registro original de Café da manhã).
Outro atrativo do roteiro é a inclusão no roteiro de Os sete gatinhos – música-tema do filme lançado pelo cineasta Neville D’Almeida em 1980 – e de Quero voltar, tema inspirado pela anistia. Lançadas em single por Erasmo naquele ano de 1979, essas duas parcerias com Roberto Carlos nunca fizeram parte dos álbuns oficiais do Tremendão.
Além dessas eventuais surpresas do repertório, dois fatores potencializam o valor documental e musical deste lançamento póstumo de Erasmo Carlos. O primeiro é que as gravações são dos anos 1970, década em que inexistiu um registro ao vivo do cantor. O segundo é que, embora o auge de popularidade da carreira solo de Erasmo tenha acontecido na primeira metade dos anos 1980, o pico de criatividade foi na década anterior.
Erasmo até recuperou o vigor jovial a partir do álbum Rock’n’roll (2009), mas o culto ao Gigante gentil persiste muito por conta da produção fonográfica da década de 1970, mote deste bem-vindo e potente álbum póstumo que reaviva o legado de Erasmo Esteves, o mais roqueiro dos Carlos.