IRON MAIDEN NO BRASIL: UM TSUNAMI PASSOU POR AQUI
9 de setembro de 2022
Por Carlos Eduardo Oliveira
A julgar pela monumental apresentação paulista da Legacy of the Beast Tour, a Donzela de Ferro ainda tem muito a dizer e lenha a queimar.
Por clichê que seja, o bordão “envelhece – e melhora – como o vinho” faz total sentido.
Do alto de um álbum corajoso e ousado e uma metralhadora de hits, o Maiden encantou gerações. Adultos, crianças (muitas), jovens, seniors: em cena, jorrou entrega, carisma, talento e, vamos combinar, “paulada pura”, para todo mundo.
Abrindo a noite, os suecos do Avatar angariaram respeito, curiosidade e muitos aplausos do crowd de perto de 70 mil almas.
Ato de abertura, foram tratados como tal: palco diminuto, PA longe da potência total – até aí, faz parte – e o pior: sem direito a telão, o que prejudicou o lado cênico que acompanha o competente death metal “cabeça” do quinteto de Gotemburgo.
“Acho que isso é amor à primeira vista entre nós e o Brasil”, brincava, simpático sem forçar a barra, radiante com a surpreendente recepção, o cantor Johannes Eckerström.
Mixando (assumidamente) Alice Cooper, Coringa e vaudeville, seu persona de palco convence como uma espécie de MC roqueiro. Idem para seu registro vocal, seguro e polivalente.
Death, grunge, hard rock: quem afirma, como alguns críticos brasileiros, que o grupo “atira para todos os lados”, talvez não tenha notado que é justamente essa sua principal característica: ser death metal sem as amarras do estilo, popularíssimo entre bandas escandinavas de rock pesado.
O Avatar deve reaparecer por aqui em breve. Mas do alto de uma carreira que já contabiliza oito trabalhos de estúdio, precisa urgente de um elemento-chave: hits.
Iron Maiden em cena
Os primeiros acordes de Doctor Doctor, do UFO, reforçam um certo frio na barriga: com pra lá de uma dúzia de shows do sexteto no currículo, seria possível ainda se emocionar com um dos maiores atos da história do rock’n’roll?
A resposta é sim, e o Maiden provou isso nas duas horas seguintes. Melódica, hipnótica, a trinca inicial do elogiado álbum Senjutsu – a faixa-título, mais Stratego e The Writing on the Wall – mostrou a incrível maturidade dos britânicos em não ter mais nada a provar e, ainda assim, “subir a régua” do que se designa como metal progressivo.
Uma rápida troca de cenários (em três minutos!) e o impactante orientalismo visual de Senjutsu dá lugar à apocalíptica mis em scene de palco do Maiden. Três petardos de diferentes épocas – Revelations (grata surpresa!), Blood Brothers e a épica Sign of the Cross elevam a temperatura à estratosfera.
Interessante notar, a maior participação das seis cordas de Janick Gers em solos, riffs e introduções de canções – o que é cool, já que o guitar man, sociólogo, tido como muito gente boa, antes se destacava mais por saracotear pelo palco do que por tocar.
Igualmente legal é notar como os caras realmente “estão lá”. Nada de “piloto automático”: um olhar atento revelava que, em gestos e expressões trocadas entre si, os músicos de fato estão se divertindo.
E Bruce Dickinson? Em uma palavra, fenomenal. Além de grande cantor, grande entertainer, no comando da ópera visual que acompanha a massa sonora avassaladora: o monstrengo Eddie (que dá as caras três vezes), tiros, explosões, avião gigante decolando, muita fumaça, e o próprio Dickinson encarnando personagens, em figurinos que vão de legionário britânico (The Trooper), piloto da Royal Air Force (em Aces High) ou dândi condenado à forca (Hallowed Be Thy Name).
E tome petardos: Flight of Icarus, Iron Maiden, Run to the Hills. Ainda que alguns poucos andamentos – Fear of the Dark é um exemplo – estejam um compasso mais lentos (afinal, o tempo passa para todo mundo), o Iron Maiden provou: enquanto tiver fôlego, reinará no Olimpo do rock.