THE BLACK CROWES NO BRASIL: UM TSUNAMI PASSOU POR AQUI
17 de março de 2023
Por Carlos Eduardo Oliveira
Curitiba tinha que ter visto isso. Floripa também. E Porto Alegre, Rio, BH… Porque 2023 mal deu a largada e já aparece, atropelando a ordem das coisas, um seríssimo candidato a melhor show do ano. O que o Black Crowes apresentou no Espaço Unimed, em São Paulo (infelizmente em data única no país de sua turnê sul-americana), foi algo… devastador. Que pagou com juros uma ausência por aqui desde os shows no distante Hollywood Rock de 1996.
O clima de noite memorável pairava: um público rocker maduro, claramente fã de blues, rock’n’roll “raiz” e cerveja – com maciça audiência feminina – literalmente “entupiu” a tradicional venue da Barra Funda. Prova, aliás, de que, como dito recentemente, shows médios, de curadoria acertada (no caso, da gigante do entretenimento Time For Fun), “fecham a conta”, no universo do showbizz.
“Guys, essa noite vamos todos shake our money maker” (“chacoalhar nossos traseiros”, em tradução literal). “Nós e vocês”, sinalizou, logo de saída, o vocalista Chris Robinson, trocadilho em alusão ao altamente elogiado primeiro álbum do grupo, Shake Your Money Maker, apresentado na íntegra no atual giro do grupo, em comemoração às três décadas de seu lançamento.
E assim foi. Durante 90 minutos cravados, a banda dos irmãos Robinson (Chris, vocais, Rich, guitarra, mais um quarteto afiado e duas backing vocals) não deixou ninguém parado com um envolvente hard’n’blues que, quando acelera o beat, atinge níveis de energia musical de pasmar muita banda (grande) de metal.
Está tudo lá: Bad Company, The Allman Brothers, Lynyrd Skynyrd, The Faces… eflúvios devidamente filtrados em um estilo próprio e matador, que inclui até passagens com protagonismo do lendário órgão Hammond, de tanta tradição na gênese do hard rock setentista.
A primeira parte do show foi dedicada ao clássico disco de 1990, que projetou a banda mundialmente. Todos os riffs iniciais partem do arsenal de Fenders (e algumas Gibsons) de Rich Robinson, que troca de guitarra em todas as canções e deixa os solos a cargo da pegada bluesy do guitarrista Nico Bereciartua.
Interessante como um álbum pode marcar gerações, fato inconteste ante a reação emocionada, até, do público, com o repertório de Shake Your Money Maker. “Twice As Hard”, “Jealous Again”, “She Talks To Angels” – composições dos Robinson que soam mais atuais que nunca. “Ele voltou a cantar bem”, comenta um amigo, sobre Chris Robinson. Casaco de lamê dourado, botas, camisa e calça pretas, o cantor é literalmente a alma dos Corvos Pretos – em algumas passagens, seu registro e potência vocal evocam astros da soul music americana das gravadoras Motown ou Stax – incrível.
Em cena, sua performance evoca Paul Rodgers (Bad Company) ou mesmo Rod Stewart, com o uso do pedestal do microfone como elemento cênico. Momentos viscerais: a poderosa “Sometimes Salvation”, e o blues-country “Wiser Time” – essa, dos raros momentos em que Rich e Chris unem vozes na mesma canção.
“Vocês estão bem? Em todo caso, aí vai some remedy”, brincou Chris Robinson, ao apresentar o mega hit radiofônico dos rapazes de Atlanta, Geórgia. “Remedy” fechou a memorável noite, seguida do bis com o rockão “Virtue and Vice”.
Curiosidade: no passado, os Robinsons – que vez ou outra se estranham, mas acabam retomando o grupo – exigiam dos promotores de seus shows legítimos tapetes persas, para seus pezinhos talentosos pisarem no palco – o YouTube não mente. Hoje, apenas entregam a festa – e que festa.